RENATA GIRALDI
da Folha Online, em Brasília
Após o retorno do intervalo nesta quinta-feira, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) que julgam a demarcação da reserva Raposa/Serra do Sol (RR) definiram 19 critérios que devem ser tomados como base para a discussão de todos os processos demarcatórios no país. O presidente da Suprema Corte, Gilmar Mendes, recomendou que todo o trabalho seja coordenado pelo TRF (Tribunal Regional Federal).
Porém, o texto final com todas as condições será elaborado pelo ministro Carlos Ayres Britto, que é relator da ação.
Para a Suprema Corte, a utilização das terras deve ser limitada, com respeito ao meio ambiente e às riquezas naturais, e também com a presença de forças policiais e Armadas.
Os 19 critérios definidos pelo STF se basearam no voto do ministro Carlos Alberto Menezes Direito --que apresentou em dezembro do ano passado as condições. O relator Ayres Britto fez algumas ressalvas e observações para as mudanças de expressões e termos.
Ayres Britto defendeu a exclusão da limitação da revisão de área de terras indígenas, após o encerramento do processo demarcatório. Mas foi voto vencido. O ministro Joaquim Barbosa foi contrário a todas as 19 condições, assim como Marco Aurélio Mello, que foi favorável à anulação da ação.
O advogado-geral da União, José Antônio Dias Tóffoli, disse que a definição tomada hoje pela Suprema Corte servirá de referência para outros julgamentos sobre processos demarcatórios envolvendo terras indígenas.
A seguir, os 19 critérios que definem o processo demarcatório da reserva Raposa/Serra do Sol e que deverá servir como referência para outras ações.
1 - O usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver como dispõe o artigo 231 (parágrafo 6º, da Constituição);
2 - O usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional;
3 - O usufruto dos índios não abrange a pesquisa e das riquezas naturais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;
4 - O usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, dependendo-se o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira;
5 - O usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da Política de Defesa Nacional, à instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico a critério dos órgãos competentes (o Ministério da Defesa, o Conselho de Defesa Nacional) serão implementados independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai. É o livre transito das Forças Armadas e o resguardo das fronteiras;
6 - A atuação das Forças Armadas da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta a comunidades indígenas envolvidas e à Funai;
7 - O usufruto dos índios não impede a instalação pela União Federal de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além de construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e de educação;
8 - O usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação, ou seja uma dupla afetação --ambiental e indígena-- fica sob supervisão e responsabilidade imediata do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
9 - O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área de unidade de conservação, também afetada pela terra indígena, com a participação das comunidades indígenas da área, ouvidas as comunidades indígenas --levando em conta usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo, para tanto, contar com a consultoria da Funai;
10 - O trânsito de visitantes e pesquisadores não índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
11 - Deve ser admitido o ingresso, o trânsito, a permanência de não índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela Funai;
12 - O ingresso, trânsito e a permanência de não índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas;
13 - A cobrança (de pedágios) de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não;
14 - É vedado negócio jurídico relacionado a terras indígenas, assim como qualquer ato que restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade jurídica ou pelos indígenas;
15 - É vedada, nas terras indígenas, qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutas, assim como de atividade agropecuária extrativa;
16 - Os bens do patrimônio indígena, isto é, as terras pertencentes ao domínio dos grupos e comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto no artigo 49, 16, e 231, parágrafo 3º, da Constituição da República, bem como a renda indígena, gozam de plena isenção tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos taxas ou contribuições sobre uns e outros;
17 - É vedada a ampliação da terra indígena já demarcada. Se for para a Raposa/Serra do Sol, a medida é válida, mas para outras reservas, o tema deve ser submetido a discussões jurídicas;
18 - Os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis;
19 - Assegurada a efetiva participação de todos os entes da Federação.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u537403.shtml
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